Que tal um café ao luar

Um dos traços mais significativos de nossa cultura, como todos sabem, refere-se ao fato de adotarmos o café como algo mais do que uma simples bebida produzida a partir dos grãos do cafeeiro, como me ensinava, muito séria, minha professora de história, no que se chamava antes de "ginásio". Lembro-me de que a professora falava (como era mesmo nome dela, meu Deus?) sobre uma lenda a respeito de algumas cabras que ficavam mais espertas quando comiam folhas e e frutos do cafeeiro e que esse foi o motivo para que o pastor experimentasse os frutos e ... bem, o resto é história, como diria Dona Dilza (sim, este era nome dela!).

Nós brasileiros, adotamos o café como elemento de união, de estreitamento de laços, de fechamento de negócios, de convites de paz ou, em sua forma mais gostosa, como pretexto para uma boa prosa.

Para quem já apreciou  A vendaMonte Santo, rogai por nós Comunhão, todos publicados no Alvinews (que, aliás, tem publicado outros belíssimos textos) e comentados, neste blog, segue mais um 'café' delicioso, daqueles que só os bons mineiros como Maria de Lourdes Camelo,  sabem fazer: Café ao luar. O texto relata costumes reais, históricos e  torna-se, por isso mesmo, uma bela metáfora para o elemento de união que se tornou, nestes tempos, tão mais difícil de ser cultivado. Temos muitas vezes a impressão de que complicamos demais as coisas. Não nos sentamos mais nas calçadas, ao luar, quer sejam noites de verão, quer sejam de inverno. Nestas, aliás, era possível até mesmo ousar uma fogueira e nosso maior medo  (mais de nossas mães do que nosso, na verdade) era o de nos queimarmos. Nossos maiores medos hoje, sejamos pais ou filhos,  são outros, bem mais complexos. Nossas queimaduras hoje não se resolvem mais com qualquer pomadinha, os placebos já não nos enganam.

Ao final de seu texto, Lourdes pergunta, de forma retórica:

"Às vezes, me surpreendo pensando:

haveria ali uma sabedoria herdada?

Intenções veladas?

Uma pedagogia?

Ou, simplesmente, um estilo de vida?"

Ouso responder-lhe, minha amiga, o que você certamente já sabe: havia, sim tudo isso e muito mais. Acho que sua escolha pela palavra pedagogia é perfeita, pois traduz e sintetiza exatamente o que ocorria nestes encontros que, felizmente, também tive. A palavra pedagogia, vale lembrar, tem origem na Grécia antiga e refere-se, literalmente, à direção ou educação de crianças.

Este texto recordou-me um outro, que se intitulava Ainda tomaremos um café juntos, uma dessas coisas que circulam pela internet e que costumo classificar como 'bobagens legais' (o que espero, não seja tomado como ofensivo). Localizei-o, em uma de suas infinitas versões, confira abaixo. Tentei localizar o autor, mas não consegui.

"Um professor, diante de sua classe de filosofia, sem dizer uma só palavra, pegou um pote de vidro, grande e vazio, e começou a enchê-lo com bolas de golf. Em seguida, perguntou aos seus alunos se o frasco estava cheio e imediatamente todos disseram que sim.

"O professor então pegou uma caixa de bolas de gude e esvaziou-a dentro do pote. As bolas de gude encheram todos os vazios entre as bolas de golf. O professor voltou a perguntar se o frasco estava cheio e voltou a ouvir de seus alunos que sim.

"Em seguida, pegou uma caixa de areia e esvaziou-a dentro do pote. A areia preencheu os espaços vazios que ainda restavam e ele perguntou novamente aos alunos, que responderam que o pote agora estava cheio.

"O professor pegou um copo de café (líquido) e o derramou sobre o pote umedecendo a areia.

"Os estudantes riam da situação, quando o professor falou: 'Quero que entendam que o pote de vidro representa nossas vidas. As bolas de golf são os elementos mais importantes, como Deus, a família e os amigos. São com as quais nossas vidas estariam cheias e repletas de felicidade. As bolas de gude são as outras coisas que importam: o trabalho, a casa bonita, o carro novo etc. A areia representa todas as pequenas coisas. Mas se tivéssemos colocado a areia em primeiro lugar no frasco, não haveria espaço para as bolas de golf e para as de gude. O mesmo ocorre em nossas vidas. Se gastarmos todo nosso tempo e energia com as pequenas coisas nunca teremos lugar para as coisas realmente importantes. Prestem atenção nas coisas que são primordiais para a sua felicidade. Brinquem com seus filhos, saiam para se divertir com a família e com os amigos, dediquem um pouco de tempo a vocês mesmos, busquem a Deus e creiam nEle, busquem o conhecimento, estudem, pratiquem seu esporte favorito... Sempre haverá tempo para as outras coisas, mas ocupem-se das bolas de golf em primeiro lugar. O resto é apenas areia'.

"Um aluno se levantou e perguntou o que representava o café.

"O professor respondeu: 'Que bom que me fizestes esta pergunta, pois o café serve apenas para demonstrar que não importa o quão ocupada esteja nossa vida, sempre haverá lugar para tomar um café com um amigo'.

 Walter Moreira – 18 jun. 2009

Minha amiga Maria de Lourdes Camelo publicou, melhor, presenteou-nos com mais um belíssimo texto (já comentei outros textos dela aqui no blog) sobre suas recordações de Alvinópolis, sua cidade natal, em Minas Gerais. Não sei se digo isso apenas porque, ainda que não o seja, tenho alma mineira, mas espanta-me como Lourdes consegue falar de lugares por onde andei e relatar com pureza de emoção, experiências que me tornaram o que sou. Talvez não seja nada disso, talvez seja simplesmente a força de sua literatura.  O fato é que não conheço Alvinópolis, nem conheci a menina que caminhava por suas ruas,  e nisto está o encanto do texto: a tradução de algum sentimento que é universal, que consegue falar particularmente comigo, com cada um de nós, justamente porque fala com todos, porque trata de coisas da alma, da delicadeza de sentimentos.

Comunhão provoca essas e outras sensações e é, por isso, literatura de primeira grandeza e merece ser degustado.

 

Recomendo aos seres humanos de plantão, àqueles que ainda não desistiram da beleza e da sensibilidade, os textos que minha amiga, Maria de Lourdes Camelo, tem publicado na coluna de literatura do site que noticia sua cidade natal, Alvinópolis, em Minas Gerais.

Lourdes tem uma escritura muito pessoal, reminiscente, envolvente, mineira, boa como um dedo de prosa com Getulino em sua presença. Aqueles que tiveram a oportunidade de conhecê-la  de perto, de beneficiar-se de sua sabedoria,  sabem que sua autocrítica é, na verdade, nossa inimiga, pois impediu-a, por muito tempo, de escrever ou de publicar coisas deliciosas como as que, livre dos pudores da "menina do Monte Santo", ou daquela que se escondia na venda do pai, vem agora nos brindar.

Confira  - A venda e Monte Santo, rogai por nós